Discussão: Loiva ferreira

Loiva ferreira




Noite de Chuva

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Chuva...Que gotas grossas!...Vem ouvir:

Uma ...duas...mais outra que desceu...

É Viviana, é Melusina, a rir,

São rosas brancas dum rosal do Céu...


Os lilases deixaram-se dormir...

Nem um frémito...a terra emudeceu...

Amor! Vem ver estrelas a cair:

Uma...duas...mais outra que desceu...


Fala baixo, juntinho ao meu ouvido,

Que essa fala de amor seja um gemido,

Um murmúrio, um soluço, um ai desfeito...


Ah! deixa à noite o seu encanto triste!

E a mim...o teu amor que mal existe,

Chuva a cair na noite do meu peito!



Florbela Espanca




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O que há em mim é sobretudo cansaço

Não disto nem daquilo,

Nem sequer de tudo ou de nada:

Cansaço assim mesmo, ele mesmo, Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,

As paixões violentas por coisa nenhuma.

Essas coisas todas -

Essas e o que faz falta nelas eternamente -;

Tudo isso faz um cansaço,

Este cansaço, cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,

Há sem dúvida quem deseje o impossível,

Há sem dúvida quem não queira nada

– Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:

Porque eu amo infinitamente o finito,

Porque eu desejo impossivelmente o possível,

Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,

Ou até se não puder ser… E o resultado?

Para eles a vida vivida ou sonhada,

Para eles o sonho sonhado ou vivido,

Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…

Para mim só um grande, um profundo,

E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,

Um supremíssimo cansaço.

Íssimo, íssimo. íssimo,

Cansaço…


Álvaro de Campos





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A nossa música!


Agora, que o silêncio é um mar sem ondas,

Deixei-me embalar pela sonata que já perdida no espaço esta,

Acabei sentado ao piano naquela praia deserta.

Toquei, toquei sem cessar...“Romeo and Juliet”

Lembras-te?...


Em cada acorde senti a melodia da tua voz,

Em cada nota, o significado das tuas últimas palavras,

Em cada compasso, o vazio do teu olhar no rebentar das ondas,

As lágrimas que teimam não se soltarem,

A partitura foi levada pela brisa...

Estava escuro, perdi-a de vista...

Mas os meus dedos não paravam...


A música estava em mim, porque o concerto era para ti.

E toquei incessantemente... Não ousei olhar para trás...

Não fosse perder uma única nota...

Aquela que iria interromper o meu sonho...

A nossa música...Havia uma esperança...

Uma sombra que pudesse surgir a cada momento...

A tua sombra... E os acordes repetiam-se...

E a sonata não tinha fim...


Na quietude da noite senti a nostalgia,

Que a partitura me deixou quando o vento a levou.

Desfez-se no silêncio das ondas revoltas,

Mas a cópia ficou em mim, porque a nossa música,

Jamais terá fim...


A noite ia longa quando fechei o piano, não estava cansado...

Mas receava acordar, sem que ouvisses,

O que para ti tocava...


Poeta das almas – Recanto das letras







Adeus, Meus Sonhos!

Álvares de Azevedo


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Adeus, meus sonhos, eu pranteio e morro!

Não levo da existência uma saudade!

E tanta vida que meu peito enchia

Morreu na minha triste mocidade!

Misérrimo! Votei meus pobres dias

À sina doida de um amor sem fruto,

E minh´alma na treva agora dorme

Como um olhar que a morte envolve em luto.

Que me resta, meu Deus?

Morra comigo

A estrela de meus cândidos amores,

Já não vejo no meu peito morto

Um punhado sequer de murchas flores!









Pensar em ti é coisa delicada.

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Pensar em ti é coisa delicada.

É um diluir de tinta espessa e farta

e o passá-la em finíssima aguada

com um pincel de marta.


Um pesar grãos de nada em mínima balança

um armar de arames cauteloso e atento,

um proteger a chama contra o vento,

pentear cabelinhos de criança.


um desembaraçar de linhas de costura,

um correr sobre lã que ninguém saiba e oiça,

um planar de gaivota como um lábio a sorrir.


Penso em ti com tamanha ternura

como se fosses vidro ou película de loiça

que apenas com o pensar te pudesse partir.



António Gedeão








A lembrança dos teus beijos...

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Inda na minh'alma existe,

Como um perfume perdido,

Nas folhas dum livro triste.

Perfume tão esquisito

E de tal suavidade,

Que mesmo desaparecido

Revive numa saudade!


Florbela Espanca








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"Deixa-me amar-te em meus silêncios

Na calmaria do teu coração que me acolhe

E de onde se desprendem meus sonhos

Em vôos etéreos de plena liberdade


Deixa-me amar-te em minha solidão

Ainda que meus labirintos te confundam

E que teus fios generosos de compreensão

Emaranhem-se no tapete dos meus enigmas


Deixa-me amar-te sem qualquer explicação

Na ternura das tuas mãos que me sorriem

Escrevendo desejos em versos despidos

Na minha alva tez que te cobre e descobre


Deixa-me amar-te em meus segredos

Para que desvendes o que também desconheço

A alma dos meus abismos onde anoiteço

E meus olhos adormecem embalados pelo mistério


Deixa-me amar-te em tuas demoras, longas horas

Em que meu corpo se veste de céu à tua espera

E minhas mãos em frenesi acendem estrelas

Para alumiar-te, ainda que ausente estejas..."



Fernanda Guimarães








A Noite Desce


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Como pálpebras roxas que tombassem

Sobre uns olhos cansados, carinhosas,

A noite desce... Ah! doces mãos piedosas

Que os meus olhos tristíssimos fechassem!


Assim mãos de bondade me beijassem!

Assim me adormecessem! Caridosas

Em braçados de lírios, de mimosas,

No crepúsculo que desce me enterrassem!


A noite em sombra e fumo se desfaz...

Perfume de baunilha ou de lilás,

A noite põe embriagada, louca!


E a noite vai descendo, sempre calma...

Meu doce Amor tu beijas a minh'alma

Beijando nesta hora a minha boca!


Florbela Espanca







A Canção de Romeu

Olavo Bilac

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Abre a janela... acorda!

Que eu, só por te acordar,

Vou pulsando a guitarra, corda a corda,

Ao luar!

As estrelas surgiram

Todas: e o limpo véu,

Como lírios alvíssimos, cobriram

Do céu.

De todas a mais bela

Não veio inda, porém:

Falta uma estrela... És tu! Abre a janela,

E vem!

A alva cortina ansiosa

Do leito entreabre; e, ao chão

Saltando, o ouvido presta à harmoniosa

Canção.

Solta os cabelos cheios

De aroma: e seminus,

Surjam formosos, trêmulos, teus seios

À luz.

Repousa o espaço mudo;

Nem uma aragem, vês?

Tudo é silêncio, tudo calma, tudo

Mudez.

Abre a janela, acorda!

Que eu, só por te acordar,

Vou pulsando a guitarra corda a corda,

Ao luar!

Que puro céu! que pura

Noite! nem um rumor..

Só a guitarra em minhas mãos murmura:

Amor!...

Não foi o vento brando

Que ouviste soar aqui:

É o choro da guitarra, perguntando

Por ti.

Não foi a ave que ouviste

Chilrando no jardim:

É a guitarra que geme e trila triste

Assim.

Vem, que esta voz secreta

É o canto de Romeu!

Acorda! quem te chama, Julieta,

Sou eu!

Porém... Ó cotovia,

Silêncio! a aurora, em véus

De névoa e rosas, não desdobre o dia

Nos céus...

Silêncio! que ela acorda...

Já fulge o seu olhar...

Adormeça a guitarra, corda a corda,

Ao luar!







As borboletas

Cecília Meireles

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Brancas, azuis, amarelas e pretas

brincam na luz as belas borboletas.


Borboletas brancas

são alegres e francas.


Borboletas azuis

gostam muito de luz.


As amarelinhas

são tão bonitinhas!


E as pretas, então . . .

Oh, que escuridão!





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