Discussão: Loiva ferreira

Loiva ferreira


Soneto 54

William Shakespeare

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Oh, como a beleza parece mais bela

com o doce ornamento que a verdade produz!

A rosa tão bela, mas mais bela a julgamos

Pelo doce aroma que nela seduz.


As rosas silvestres têem a cor tão profunda

Quanto a tintura das rosas perfumadas,

Têem os mesmos espinhos e brincam tão vivamente

Quando o sopro do verão expõe os botões velados;


Mas exibem-se apenas para si mesmas,

Vivem esquecidas e murcham obscuras;

Morrem sozinhas. As doces rosas, não;


De suas doces mortes surgem as mais doces essências.

e assim também a ti, a bela e adorável mocidade,

Fenecido o frescor, revela em versos tua verdade.






Musa Consolatrix

Machado de Assis

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Que a mão do tempo e o hálito dos homens

Murchem a flor das ilusões da vida,

Musa consoladora,

É no teu seio amigo e sossegado

Que o poeta respira o suave sono.


Não há, não há contigo,

Nem dor aguda, nem sombrios ermos;

Da tua voz os namorados cantos

Enchem, povoam tudo

Da íntima paz de vida e de conforto.


Ante esta voz que as dores adormece,

E muda o agudo espinho em flor cheirosa,

Que vales tu, desilusão dos homens?

Tu que podes, ó tempo?

A alma triste do poeta sobrenada

À enchente das angústias,

E, afrontando o rugido da tormenta,

Passa cantando, alcíone divina.


Musa consoladora,

Quando da minha fronte da mancebo

A última ilusão cair, bem como

Folha amarela e seca

Que ao chão atira a viração do outono,

Ah! no teu seio amigo

Acolhe-me, — e haverá minha alma aflita,

Em vez de algumas ilusões que teve,

A paz, o último bem, último e puro!


(Crisálidas, 1864.)





Pudesse eu

Sophia de Mello Breyner Andresen

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Pudesse eu não ter laços

nem limites

Ó vida de mil faces

transbordantes

Para poder responder

aos teus convites

Suspensos na surpresa

dos instantes!






Soneto

"Fogo no olhar"


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Quero o presente inaugurado em flores

Esse enroscar de corpos e almas presas.

Quero o fogo que promete nas madrugadas

Sem pudor, escancarar nossas certezas.


Quero o sonho que abre um jardim na alma

Onde colho poesias que enchem de beleza

Que apascenta os bichos das minhas selvas

Quero toda euforia a perfumar com leveza.


Quero o beijo que o tempo tardio devorou

Os teus transeuntes quero nas minhas ruas.

Toda festa e folia que dissipa a tristeza.


Quero a pele dourada, que o sol beijou.

Flores vicejando, a emprestar delicadeza.

E no olhar, pra sempre essa chama acesa.


Glória Salles







Flor da Mocidade

Machado de Assis

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Eu conheço a mais bela flor;

És tu, rosa da mocidade,

Nascida, aberta para o amor.

Eu conheço a mais bela flor.

Tem do céu a serena cor,

E o perfume da virgindade.

Eu conheço a mais bela flor,

És tu, rosa da mocidade.


Vive às vezes na solidão,

Coma filha da brisa agreste.

Teme acaso indiscreta mão;

Vive às vezes na solidão.

Poupa a raiva do furacão

Suas folhas de azul celeste.

Vive às vezes na solidão,

Como filha da brisa agreste.


Colhe-se antes que venha o mal,

Colhe-se antes que chegue o inverno;

Que a flor morta já nada val.

Colhe-se antes que venha o mal.

Quando a terra é mais jovial

Todo o bem nos parece eterno.

Colhe-se antes que venha o mal,

Colhe-se antes que chegue o inverno.







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"...ando de um lado pra outro, dentro de mim,
as mãos abandonadas,
pronta pra inventar uma tragédia russa,
pronta pra criar um motivo que me acorde (...)
tinha vontade de fazer um embrulho de mim,
com papel de seda, lacinho de fita,
e mandá-lo pra você.
Aceita?"

Clarice Lispector





Volta até Mim

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"Deixa-me amar-te em meus silêncios

Na calmaria do teu coração que me acolhe

E de onde se desprendem meus sonhos

Em voos etéreos de plena liberdade


Deixa-me amar-te em minha solidão

Ainda que meus labirintos te confundam

E que teus fios generosos de compreensão

Emaranhem-se no tapete dos meus enigmas


Deixa-me amar-te sem qualquer explicação

Na ternura das tuas mãos que me sorriem

Escrevendo desejos em versos despidos

Na minha alva tez que te cobre e descobre


Deixa-me amar-te em meus segredos

Para que desvendes o que também desconheço

A alma dos meus abismos onde anoiteço

E meus olhos adormecem embalados pelo mistério


Deixa-me amar-te em tuas demoras, longas horas

Em que meu corpo se veste de céu à tua espera

E minhas mãos em frenesi acendem estrelas

Para alumiar-te, ainda que ausente estejas..."


Fernanda Guimarães



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Conto de Fadas

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Eu trago-te nas mãos o esquecimento
Das horas más que tens vivido, Amor!
E para as tuas chagas o unguento
Com que sarei a minha própria dor.

Os meus gestos são ondas de Sorrento...
Trago no nome as letras duma flor...
Foi dos meus olhos garços que um pintor
Tirou a luz para pintar o vento...

Dou-te o que tenho: o astro que dormita,
O manto dos crepúsculos da tarde,
O sol que é de oiro, a onda que palpita.

Dou-te, comigo, o mundo que Deus fez!
Eu sou Aquela de quem tens saudade,
A princesa de conto: "Era uma vez..."

Florbela Espanca


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Lágrimas Ocultas


Se me ponho a cismar em outras eras
Em que rí e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi outras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...

E a minha triste boca dolorida
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...

E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!


Florbela Espanca


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Albert Camus

Amar é...

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sorrir por nada e ficar triste sem motivos

é sentir-se só no meio da multidão,

é o ciúme sem sentido,

o desejo de um carinho;

é abraçar com certeza e beijar com vontade,

é passear com a felicidade,

é ser feliz de verdade!

E no meio de um inverno eu finalmente

aprendi que havia dentro de mim

um verão invencível.


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